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Quanto custa um consumidor desinformado?


Você vai a uma farmácia atrás de aspirina. Lá encontra a aspirina genérica e a aspirina (de fato aspirina, o nome é propriedade da Bayer) da Bayer. As duas estão lado a lado na prateleira. A dosagem, o uso, os ingredientes são os mesmos. Em termos de eficácia, portanto, não há diferença alguma entre genérico e Bayer. A aspirina genérica custa 1/3 do preço da aspirina de marca, da Bayer. Você compra a aspirina Bayer ou a genérica? E, se você compra Bayer, por que você compra a aspirina da Bayer ao invés da aspirina genérica?

Um working paper (NBER, 2014) recente (link aqui) de alguns professores da escola de negócios da Universidade de Chicago tenta responder esta questão. O trabalho analisa uma base de dados Homescan da Nielsen sobre compra de remédios e alimentos e mostra que: (i) Um número grande de consumidores prefere o produto de marca ao genérico e (ii) que a decisão de comprar marca ao invés de genérico está relacionada ao grau de informação que o consumidor tem sobre o produto que está comprando – isto é, consumidores mais informados compram genérico; consumidores menos informados compram marca. Os dados utilizados são referentes ao mercado norte-americano.

Para medir o grau de informação sobre o produto os autores utilizam características observáveis dos compradores. A principal proxy para grau de informação é a ocupação do comprador. De acordo com os autores, tudo o mais constante, um médico ou um farmacêutico tem mais informação do que um economista no tocante a decisões de compra de medicamentos; analogamente, um chef de cozinha é mais informado do que um advogado que não sabe cozinhar no tocante a decisões de compra de alimentos.

Intuitivamente, esta proxy parece ser boa para medir o grau de informação do consumidor sobre o produto que ele quer comprar. Usando dados da Nielsen os autores confirmam esta suposição: Farmacêuticos ou médicos acertam muito mais o ingrediente ativo de um tipo de medicamento do que indivíduos com renda similar, nível educacional similar, idade similar, etc. mas com formação em outra área.

Os autores então comparam a decisão de comprar medicamento de marca ou genérico entre diferentes grupos de consumidores. O consumidor tipo “A” é igual ao tipo “B” em tudo que é observável (renda, anos de estudo, idade, etc.) exceto pelo fato de que “A” é informado (ele é um médico ou um farmacêutico) e “B” não é informado (ele é um economista) – diferenças entre estabelecimentos de compra, período da compra, etc. também estão controladas.

O trabalho mostra que os médicos e farmacêuticos compram medicamentos genéricos mais frequentemente do que consumidores parecidos mas com formação em outra área. Da mesma forma, chefs de cozinha  preferem comprar açúcar com a marca do supermercado do que o açúcar de uma marca nacionalmente conhecida – quando comparados, por exemplo, a um sujeito com características muito similares mas que não sabe nada de cozinha. Para reforçar estes resultados os autores mostram que chefs não preferem medicamentos genéricos a medicamentos de marca e que médicos não preferem açúcar com a marca do supermercado a açúcar de marca.

A ideia por trás do resultado é a seguinte: Para os produtos analisados no trabalho não existe diferença alguma entre a marca e o genérico – açúcar do Carrefour adoça o café do mesmo jeito que o açúcar União. O pessoal informado sabe que esta diferença não existe e, portanto, não paga mais pela marca. Os desinformados não percebem que marca e genérico são a mesma coisa, exageram sua percepção a favor do produto de marca e isso os torna mais propensos a pagar mais pela marca.

Segundo os cálculos apresentados, o custo desta desinformação é grande. Os autores estimam que os consumidores norte-americanos poupariam US$44 bilhões anualmente se comprassem genérico ao invés de marca. Não é possível dizer se o “exagero” do desinformado a favor da marca – o que explicaria o custo acima – é devido aos US$140 bilhões anualmente gastos em publicidade nos EUA.  Neste caso, a publicidade estaria “enganando” o consumidor e gerando custos para a sociedade. Medidas de regulatórias seriam justificáveis.

Fábio Miessi
— Professor do Departamento de Economia FEA-USP



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